segunda-feira, 23 de novembro de 2015

A Síndrome de Hubris, ou a "chave do WC"

Aquele a quem os deuses querem destruir, primeiro deixam-no louco. Eurípedes.

O chefe. O chefão. O Chefinho. Todos têm em comum padecerem de igual maleita: da Síndrome de Hubris.  Numa visão simplista da coisa, trata-se de "sentir-se mais do que se é". Nenhuma formiga está livre do ataque da Hubris, ou "descomedimento", na sua raíz grega. Principalmente as alegres formigas alpinistas sociais. 


No melhor dos casos, existe a Hubris que facilmente descamba para o ridículo e, consequentemente, na insubordinação de todo um carreiro perante o chefe. Num um plano mais global, a face negra desta síndrome vive nos seus efeitos secundários: um  líder ministerial a dedicar-se desenfreadamente à fraude, ao tráfico de influências, enfim, ao ataque despudorado ao nosso direito à transparência tornou-se rotina em algumas democracias desvirtuadas.  Apenas porque tal ente "sente que pode". Dão-lhe um gabinete forrado a madeira importada e ei-lo senhor da galáxia. Seja qual for o trono, a sensação hubrica não se mede pela imponência ou forma do mesmo. O sofredor de Hubris, uma vez sentado na sanita, sente que aquilo que evacua cheira a rosas. E o melhor é cheirar e assentir, pois não sabemos a desmesura da sua demência. Desconhecemos a natureza e a força das suas armas. Queremos continuar vivos.

Na verdade, caras formigas, esta Encantadora já aprendeu o seguinte: aquilo que faz um chefe é o facto de ter seguidores. Portanto, antes de desfiarem o vosso rosário de queixas particular, pensem antes que foram vocês, formiguinhas, a eleger o medíocre que agora se sente à vontade para, às dentadinhas de coelho, esmifrar-vos o salário; foram vocês que ofereceram "àquela "gaja" ou "àquele gajo" a "chave da casa-de-banho" e, com tal poder, vêem-no em gáudio perante as vossas aflições. Fomos todos nós, em última análise, a permitirmos a nossa própria submissão, por exemplo, a uma figura claramente despida de carisma e sentido de Estado, ao tomarmos por firme liderança o que não passa de tirania. E os tiranos, como nos ensina a história, foram criados no berço da insegurança.

O chefe. A chefe. Os narcisistas machos e fêmeas que empapelam as nossas acções ao ponto de esmorecermos e paralisarmos de vez. Os pretensos "líderes" cujo aperto de mão, frio, amolecido pela tibieza faz arrepiar cabelos. Mas a Hubris comanda-os e, portanto, nada há a fazer senão imaginarmos que alguém aperta um botão e eles explodem, sonora e vivamente, diante de nós. O Encantamento? O mais imediato será dar-lhes um banho de realidade:  «obrigá-los a comer uma triste sopa ao jantar, 364 dias por ano, tirando-se um dia (vá lá), e lhes dar-lhes a roer uma costeleta. Contudo, os banhos de realidade existem no exterior das muralhas, retirar os doentes da sua ilusão palaciana é uma tarefa que exige o esforço de gente realmente capaz. De verdadeiros líderes. Foi Zeus quem castigou Prometeu (o tal que roubou o fogo aos deuses), não o contrário. Mas antes viu-o enlouquecer com a quantidade de fogueiras que ele próprio ateou. A derrota do orgulho desmedido pode tardar, mas é certa. Palavra de Encantadora.



domingo, 1 de novembro de 2015

Tradições importadas...e depois?

As nossas tradições são todas boas. As dos "estrangeiros" são recebidas como algo exótico ou, na pior das hipóteses, "americano". 

Para alguns de nós, europeus, o "americano" festeja tradições que nem sequer o são, pois  duas centúrias  não chegam para elevar mais alto uma única árvore genealógica. Neste e noutros aspectos,  a nossa arrogância eurocêntrica compete com a dos E.U.A, que quase ordena a Pax Americana, por meio da imposição universal da democracia.

Nós, os europeus, adoramos a deusa Europa, parideira de respeito por ter dado à luz Leonardo da Vinci e Albert Einstein, Marie Curie e José Saramago. E porque não falar de Hitler, aquele grande estadista? Para ao europeu de Direita, o americano puro tem um ligeiro atraso mental, come gelado em baldes de cinco litros e vota mal. Para a Esquerda, os americanos são capitalistas, não separam os resíduos, são belicistas desde a creche e votam mal. No geral, tanto à Direita como à Esquerda, "os americanos" são um punhado de crianças hiperactivas com défice de atenção, a que todos os assuntos interessam, dado os estudos científicos que escorrem pelas paredes das respectivas Universidades. Crianças que inventam coisas do nada (uma Nação poderosa, por exemplo) e, como no caso do Haloween, inventam reuniões de mascarados na véspera do Dia de Todos os Santos. 

No capítulo das tradições, então, tanto as formigas europeias dos carreiros à Direita, como as dos carreiros à Esquerda, clamam bem alto a sua indignação perante aquela festividade "americana" chamada Halloween, algo que terá tanto de extemporâneo como de  ignóbil, ao ganhar importância sobre a catequese ou a Festa do Avante. Eu, Encantadora, sempre embrenhada nos meus calhamaços, faço o seguinte  aviso à navegação: o cristianismo absorveu as festividades pagãs, como sucedeu com a celebração do Solistício de Inverno, "transformada" em Natal; foi a cultura judaico-cristã que, afinal, dissolveu tradições ancestralíssimas, e não o contrário. E para quem o Halloween é uma importação macabro-capitalista do "americano", cai-lhe em cima esse mesmo factor, o da ancestralidade. Antes dos "ismos", acendiam-se fogueiras de Beltane por todo o território Celta. Caras formigas: de nada nos serve acirrarmos quezílias quando se trata de validar, com o selo europeu, "o que vem de fora", usando-se a frase mais provinciana alguma vez pronunciada.

As nossas tradições, queridas formiguinhas amantes de touradas, matanças de porco em adro de igreja e assamento de gatos em postes, envolvem sangue verdadeiro. Quanto a mim, prefiro o falso que irei decalcar na minha pele para ir à festa de Halloween a que fui convidada. Uma adaptação caseira do Samahain, a Festa dos Mortos, igualmente celta. Também a seu tempo substituída pelo Dia de Todos os Santos (movido para esta data), em decreto promulgado pelo Papa Gregório III (835 d.C.).

Irei festejar também em memória dos meus antepassados, os celtas de uma europa antiga, porém bem mais tolerante e, como hoje se quer, uma europa laica.

Também podem ler: http://observador.pt/2015/10/30/a-historia-do-dia-de-todos-os-santos-que-quase-morreu-com-o-halloween/