domingo, 17 de maio de 2015

António Zambujo sim, fado assim-assim


Cresci numa casa onde se escutava Carlos Paredes e António Chaínho (entre muitíssimos outros), portanto não se trata de negar a minha portugalidade, dado o título deste post. O que está em causa são factores como a pungência do tom fadista, a fatalidade algo doentia e, claro, o destino (fado) a que estamos sujeitos - por tudo e por nada, eis-nos despojados de vontade própria e entregues a um deus que, invariavelmente, escreve-o por linhas tortas. Ouve-se de vez em quando, até se gosta, mas insisto na dosagem homeopática. Muito fado é demasiado fado e nós, um dos povos mais depressivos do Sul da Europa, não precisamos exceder-nos em motivos para afogar mágoas no álcool ou nas drogas de farmácia.

Sendo regra, eu não possuir um único disco de Fado, a mesma traz consigo a excepção: António Zambujo. Mais que fadista, um trovador que, em meu entender (alguma formiga mais informada pode discordar) não teme influências de géneros, quer dos brasileiríssimos Chorinho, Choro-canção e Bossa Nova, da polifonia das vozes búlgaras ("Chamateia"), sem contornar o Cante Alentejano, não fosse António nado e criado em Beja.

António Zambujo Tem uma forma própria de acolher o género, inculcar-lhe um destino diferente, contemporâneo, no seu traço vocal mais ou menos intimista, muito, muito longe do registo esgoelado de alguns intérpretes do fado tradicional. Ele até pode cantar "Nem às paredes confesso", mas não me deprime, antes faz-me imaginar raparigas do Sul sentadas sob os sobreiros, entoando os seus amores proibidos. O Fado de António Zambujo não nos submete à tristeza, mas revela-nos como se pode aceitar a vida tal como ela é, sem arroubos de desespero.

Ontem à noite (16/05/2015) tive o privilégio de ver ao vivo António Zambujo. Apesar do concerto terminar com o tema "Guia", o qual me relembra o meu próprio fado, deitei-me imbuída de um sentimento de aceitação. Sem dramas de xaile negro.





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3 comentários:

  1. Apetece-me pôr o xaile negro? Também a mim me apetece, não raras vezes, depois de ouvir um fado, colocar um boné marialva, dar alpista ao canário amarelo e regar o majerico.

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  2. Eu queria dizer "Apetece-te" e não "Apetece-me". Estou sonolento.

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  3. Não, não xaile negro, não. Deslizar por debaixo dos lençóis e chorar só um bocadinho.











    Gosto do boné marialva!



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